24 julho 2010

preciosa

'Com esse nome nunca te poderei perguntar pela tua filha' disse-lhe eu com ar sério mas, ao mesmo tempo, divertido. 'E porquê? Porque razão não podes perguntar-me pela minha menina?' 'É simples', disse-lhe eu, 'imagina o que as pessoas pensarão quando eu disser: Como é que está "A Minha"'? Percebeu e abandonou-se numa abundante gargalhada!

Chamava-se Gúgu - Preciosa - e já andava pelos trinta e tal anos quando teve a sua menina.
Explicou-me que a razão de ter dado à sua menina o nome de "A minha" foi porque, quando por ocasião do parto estava no hospital, as enfermeiras perguntavam repetidamente 'de quem é esta criança que está a chorar' ela dizia sempre 'é a minha'. Quando se tratou de baptizar a menina, é claro que o primeiro nome que lhe veio à cabeça foi... "A minha"!

Escolher o nome para a criança recém-nascida é, tradicionalmente, um dever do pai da criança; ou então, como acontece nos nossos dias, uma tarefa conjunta do pai e da mãe - caso se assumam como tal.  

Mas a Gúgu esteve sózinha, sempre sózinha: antes do nascimento da sua menina, durante e depois. O pai da criança, esse foi apenas... progenitor, nunca foi pai. Tanto que após menos de um ano de vida da criança, matou a Gúgu e, de seguida, enforcou-se.

Gúgu trabalhava como educadora com as crianças mais pequenas no infantário da Igreja de Maria Imaculada; a sua sala era... um contentor metálico. Passava os dias numa roda viva de volta dos seus vinte e tal petizes: a mudar fraldas, a limpar, a dar de comer, a lavar. Um sorriso enorme brilhava continuamente no rosto da Gúgu! 

O contentor era sempre a primeira sala na minha visita: tocava-me a dedicação e a contínua boa disposição da educadora, num ambiente tão sem condições mas de que ela nunca se lamentava. Bastavam-lhe as crianças! E "A minha" estava lá no meio delas, uma entre as muitas a quem ela se dedicava e amava por igual.

E "A minha" ficou a criança de todos os familiares da Gúgu, mas ficou sem a sua Mãe: chamará mãe a todas as mulheres da família, é assim entre os Zúlus, mas nunca dirá Mãe naquele jeito que todos nós conhecemos e com aquele sentimento que nos enche o coração...

"A minha" tem agora dois anos mas por muito que chame pela mãe - na escuridão da noite, quando tiver fome ou quando cair e se magoar - a sua Mãe, a quem deram o nome de 'preciosa', não pode responder-lhe nem acariciá-la nem abraçá-la... Nem "A minha" poderá alguma vez sentir o que é um carinho de Mãe...

Hà dias encontrei-me com pessoas da família da Gúgu que me disseram: 'está aqui "A minha", vem vê-la'. Está linda, lindíssima "A minha"! Estou certo que herdou de sua Mãe a boa disposição e o sorriso. Abracei "A minha", dei-lhe um beijo na testa e disse-lhes: 'Agora devíeis mudar-lhe o nome e chamá-la..."A nossa"!

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